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Masque de Bhairava
(Musée d'art asiatique de Berlin) |
Bhairava e Bhairaví, amorosamente unificados no mesmo nível de conhecimento, deixaram o estado indiferenciado para que, assim, seu diálogo pudesse iluminar todos os seres.
1.
A Shaktí de Bhairava, Bhairaví, disse:
Ó Deus, que manifestas o Universo e fazes luz dessa manifestação, tu és nada mais do que o meu Eu (Self). Eu tenho recebido os ensinamentos de Trika, a quintessência de todas as Escrituras. Entretanto, ainda tenho algumas dúvidas.
2-4.
Ó Deus, do ponto de vista da Absoluta Realidade, qual é a essência da natureza de Bhairava? Reside ela na energia dos fonemas? Na realização da essência da natureza de Bhairava? Em algum mantra em particular? Nas três Shaktís? Na presença domantra que vive em todos as palavras? No poder do mantra presente em cada partícula do Universo? Reside ela dentro doschakras? No som Há? Ou ela é apenas a Shaktí?
5-6.
Aquilo que é composto, é nascido fora de ambas, energia imanente e transcendente, ou somente fora da energia imanente? Se for produto apenas de energia transcendente, então a própria transcendência não teria objetivo. A transcendência não pode ser diferenciada por sons ou partículas e a sua natureza indivisível não pode ser expressa na dualidade.
7-10.
Ó Mestre, possa Sua graça afastar minhas dúvidas!
Excelente! Tuas questões, ó bem amada, são a essência dos Tantras. Eu vou desvelar-te um ensinamento secreto. Tudo o que é percebido como forma composta da esfera de Bhairava deve ser considerado como fantasmagoria, mágica ilusória, uma cidade fantasma pairando no céu. Tal descrição serve apenas para guiar aqueles que caem presas da ilusão e de atividades mundanas em direção à contemplação. Tais ensinamentos fazem sentido somente àqueles interessados em rituais e práticas externas e presos na dualidade.
11-13.
Do ponto de vista do absoluto, Bhairava não está associado com letras, nem com fonemas, nem com as três Shaktís, nem com o ato de abrir os chakras, nem com qualquer outra crença, e Shaktí não constitui sua essência. Todos estes conceitos contidos nas Escrituras são direcionados àqueles que têm a mente ainda muito imatura para conceber a Realidade Suprema. São apenas aperitivos que existem para impulsionar aspirantes em direção a um comportamento ético e a práticas espirituais, para que assim eles possam realizar, algum dia, que a natureza última de Bhairava não está separada do seu próprio Eu.
14-17.
Êxtase místico não é assunto para pensamentos dualistas: ele é completamente livre de qualquer noção de localização, espaço ou tempo. Essa verdade somente pode ser tocada pela experiência. Só pode ser alcançada por aqueles completamente libertos da dualidade e do ego, firme e plenamente estabelecido na consciência do Eu. Esse estado de Bhairava é preenchido com o puro prazer da unidade do tantrika (praticante do Tantra) com o Universo. Somente esse estado é a Shaktí. Dentro da realidade da própria natureza de alguém, assim reconhecida, contendo o Universo inteiro, esse alguém alcança a mais elevada esfera. Quem então pode ser adorado pela fé? Quem pode, então, ser preenchido por esta adoração? Somente esta condição reconhecida como suprema é a Deusa Suprema.
18-19.
Assim como não há diferença entre a Shaktí e aquele que a incorpora, nem entre substância e objeto, a Shaktí é idêntica ao Eu. A energia das chamas nada mais é do que fogo. Toda a distinção nada mais é que prelúdio ao caminho do verdadeiro conhecimento.
20-21.
Aquele que alcança a Shaktí concebe a não distinção entre Shiva e Shaktí e entra pela porta do divino. Tal como o espaço é reconhecido quando iluminado pelos raios do sol, assim Shiva é reconhecido através da energia de Shaktí, que é a essência do Eu.
22-23.
Ó Deus supremo! Tu que carregas um tridente e uma guirlanda de crânios, como alcançar a plenitude absoluta de Shaktí que transcende toda a noção, toda a descrição, abolindo tempo e espaço? Como realizar esta não separação do Universo? Em que sentido é dito que a Shaktí suprema é a porta secreta para o estado de Bhairava? Podes responder a essas questões absolutas em linguagem simples?
24.
A Shaktí suprema se revela quando inalação e exalação nascem e morrem nos seus dois pontos extremos, alto e baixo. Assim, entre duas respirações, experiencia o espaço infinito.
25.
Entre inalação e exalação, entre parar e seguir, quando a respiração se mantém estável entre os dois pontos extremos, interior e exterior do coração, dois espaços vazios te serão revelados: Bhairava e Bhairaví.
26.
Com o corpo relaxado durante a exalação e a inalação, deixa que tua mente se perca e perceba o teu coração, o centro energético onde flui a absoluta essência de Bhairava.
27.
Quando tiveres inalado ou exalado completamente, quando o movimento da respiração parar por si próprio, nessa quietude universal, a noção do ego desaparece e Shaktí se revela.
28.
Considera a Shaktí como brilho, luz mais e mais sutil, levada para cima através do caule do lótus, de centro a centro, pela energia da respiração. Quando ela se estabiliza no centro mais elevado, é o despertar de Bhairava.
29.
O coração se abre totalmente e, de centro a centro, Kundaliní dispara, ascendendo como um raio. Então, a glória de Bhairava se manifesta.
30.
Medita nos doze centros de energia, nas doze sílabas relacionadas a eles e liberta-te do materialismo para alcançar a suprema sutileza de Shiva.
31.
Foca tua atenção entre as sobrancelhas, mantém tua mente livre de qualquer pensamento dualista, deixa que tua forma seja preenchida com a essência do alento até o topo de tua cabeça e lá, mergulha em radiante espacialidade.
32.
Imagina os cinco círculos coloridos da pena de um pavão como sendo teus cinco sentidos disseminados por um espaço ilimitado e residindo na espacialidade do teu coração.
33.
Vazio, parede, seja qual for o objeto de contemplação, ele é a matriz da espacialidade da tua própria mente.
34.
Fecha teus olhos, veja todo o espaço como se este tivesse sido absorvido pelo interior da tua cabeça, torna teu olhar na direção interior e lá, vê a espacialidade da tua verdadeira natureza.
35.
O canal interior é a Deusa, como o caule do lótus, vermelho por dentro, azul por fora. Ele corre através do teu corpo. Meditando sobre este vácuo interior, alcançarás espacialidade divina.
36.
Conecta as sete aberturas da tua cabeça com teus dedos e te funde em bindu, o espaço infinito entre tuas sobrancelhas.
37.
Se meditares sobre o teu coração, sobre o centro do topo ou entre os olhos, a fagulha que dissolverá pensamentos discursivos entrará em ignição, como quando se esfregam as pálpebras com os dedos. Então, te dissolverás na suprema consciência.
38.
Entra no centro do som espontâneo que ressoa por si mesmo, como o som ininterrupto de uma cachoeira. Ou enfiando os dedos nos ouvidos, ouve o som dos sons e alcança o Brahman, a imensidão.
39.
Ó Bhairaví, canta o mantra Om, o mantra da união amorosa de Shiva e Shaktí, vagarosa e conscientemente. Entra no som e quando ele se desvanecer, desliza para a liberdade do ser.
40.
Foca o surgimento ou o desaparecimento de um som, então alcança a inefável plenitude do vazio.
41.
Estando totalmente presente numa canção, na música, entra na espacialidade com cada som que surge e dissolve-se dentro dela.
42.
Visualiza uma letra (símbolo), deixa-te ser preenchido pelo seu brilho. Com aberta consciência, entra primeiramente na sonoridade da letra, então numa sensação mais e mais sutil. Quando a letra se dissolver no espaço, sé livre.
43.
Quando contemplas a espacialidade luminosa do teu próprio corpo irradiando em todas as direções, liberta-te da dualidade e te une com o espaço (universo).
44.
Se contemplares simultaneamente a espacialidade acima e abaixo, então a energia sem corpo te carregará para além do pensamento dualista.
45.
Reside simultaneamente na espacialidade na base, no teu coração, acima da tua cabeça. Assim, na ausência do pensamento dualista, a divina consciência desabrocha.
46.
Em um momento, percebe a não dualidade em um ponto do teu corpo, penetra o espaço sem limites e alcança a essência liberta da dualidade.
47.
Ó ser de olhos de gazela, deixa o éter permear teu corpo, funde-te na indescritível espacialidade da tua própria mente.
48.
Supõe que teu corpo é pura espacialidade radiante contida pela tua pele e alcança o infinito.
49.
Ó beleza! Sentidos disseminados no espaço dentro do teu coração, percebe a essência de Shaktí como indescritivelmente fino pó de ouro cintilando em sua cabeça e partindo daí são despejados no espaço. Então conhecerás o supremo prazer.
50.
Quando teu corpo é permeado pela consciência, tua mente, unidirecionada, dissolve-se no teu coração, e tu penetras na realidade.
51.
Fixa tua mente no teu coração quando engajado em atividades mundanas, assim a agitação desaparecerá e em poucos dias o indescritível acontecerá.
52.
Fixa tua mente no fogo, mais e mais incandescente, que brota dos teus pés e te incendeia por inteiro. Quando nada mais restar que cinzas espalhadas ao vento, conhece a tranquilidade do espaço que volta ao espaço.
53.
Vê o mundo inteiro como um inferno em chamas. Então, quando tudo se tornar em cinzas, penetra a felicidade pura.
54.
Se mais e mais sutis tattwas são absorvidos por sua própria origem, a Deusa suprema te será revelada.
55.
Alcança o intangível alento focado entre teus olhos, então quando surge a luz deixa que Shakti desça ao teu coração e lá, na radiante presença, no momento de dormir, aprende a mestria dos sonhos e conhece o mistério da morte.
56.
Considera a totalidade do Universo sendo dissolvida em formas mais e mais sutis até que mergulhe em consciência pura.
57.
Se meditares sem o limite do espaço no tattwa Shiva, que é a quintessência de todo o Universo, conhecerás o êxtase supremo.
58.
Ó grande Deusa, percebe a espacialidade do Universo, e seja o jarro que o contém.
59.
Olha para uma vasilha ou outro recipiente sem ver seus lados ou o material que o compõe. Em pouco tempo torna-te consciente do espaço.
60.
Assume estar em um lugar infinitamente espaçoso, livre de árvores, montanhas, vales. Deixa que teu olhar se dissolva no espaço vazio, enquanto tua mente relaxa.
61.
No espaço vazio que separa dois instantes de consciência, radiante espacialidade é revelada.
62.
Assim que o impulso de fazer algo surgir, pare. Então, nâo estando no impulso precedente nem no próximo, a realização brotará intensamente.
63.
Contempla todas as formas do teu próprio corpo e aquelas do universo inteiro como sendo de idêntica natureza. Assim teu ser onipresente e tua própria forma descansa em unidade e tú alcançarás a natureza última da consciência.
64.
Durante qualquer atividade, concentra-te no intervalo entre inalação e exalação. Assim atinge o êxtase.
65.
Sente tua essência: ossos, carne e sangue, saturados com a essência cósmica, e conhece o prazer supremo.
66.
Ó beleza com olhos de gazela, considera os ventos como sendo teu próprio corpo feito de prazer. Quando sentires a vibração, alcança a presença luminosa.
67.
Quando teus sentidos se desfazem e tua mente se torna quieta, entra na energia do alento e quando sentires um formigamento, conhece o prazer supremo.
68.
Quando praticas um ritual sexual, deixa que os pensamentos residam no balançar de teus sentidos como o vento nas folhas e alcança o gozo celestial do amor extático.
69.
No princípio da união esteja no fogo da energia liberada pelo prazer da intimidade sensual. Funda-te na divina Shakti e mantenha-te queimando no espaço, evitando as cinzas no final. Estes deleites são em verdade aqueles do Eu.
70.
Ó deusa! O prazer sensual do gozo da união íntima pode ser reproduzido a qualquer momento pela essência luminosa do espírito que se rememora intensamente este gozo.
71.
Quando te reencontrares com um ser amado, esteja totalmente dentro desta felicidade e penetra este espaço luminoso.
72.
Na hora da euforia e da expansão causada por delicadas comidas e bebidas, esteja totalmente nesse deleite e através dele experimenta o gozo supremo.
73.
Funde-te no prazer sentido através da música, ou outros prazeres de outros sentidos. Se te imergires neste prazer, alcanças o divino.
74.
Em qualquer lugar onde encontres satisfação, a mais profunda essência do prazer te será revelada se te mantiveres neste lugar sem deixar que tua mente divague.
75.
No momento de dormir, quando o sono ainda não chegou e o estado de vigília se desvanece, neste exato momento, conhece a Deusa suprema.
76.
No verão, quando teu olhar se dissolve no infinito céu azul, penetra nesta luz que é a essência de tua mente.
77.
Entrarás na espacialidade de tua própria mente no momento em que a intuição se liberta através da fixação do olhar, a sucção ininterrupta do amor, os sentimentos violentos, a agonia pela morte.
78.
Sentado em posição confortável, pés e mãos no vazio, ascenda ao espaço da inefável plenitude.
79.
Numa posição confortável, as mãos abertas e na altura das espáduas, uma zona de espacialidade luminosa se difunde gradualmente entre tuas axilas, banha o coração e traz paz profunda.
80.
Olha fixamente sem piscar para um pedregulho, um pedaço de madeira, ou outro objeto ordinário qualquer, o pensamento perde todo o propósito e rapidamente alcança Shiva/Shakti.
81.
Abre tua boca, volta tua mente para a tua língua ao centro da cavidade oral, exala com o som HA e conhece a pacífica presença para o mundo.
82.
Deitado de forma plana, vê teu corpo sem sustentação. Deixa que teus pensamentos se dissolvam no espaço, então os conteúdos da profundeza de tua consciência se dissolverão e experimetarás pura presença, liberta dos sonhos.
83.
Ó Deusa, sente os movimentos extremamente lentos do teu corpo, de um monte, de um veículo e, com a mente em paz, submerge no espírito divino.
84.
Fita o límpido céu azul sem piscar. A tensão dissolver-se-á durante teu olhar e então alcança a sagrada calma de Bhairava.
85.
Penetra a radiante espacialidade de Bhairava espalhada dentro de tua própria cabeça, abandona espaço e tempo, seja Bhairava.
86.
Quando alcançares Bhairava dissolvendo a dualidade enquanto desperto, quando a presença desse espaço continua durante o sonho, e quando então cruzares a noite do sono profundo na forma real de Bhairava, conhece o infinito esplendor do despertar da consciência.
87.
Durante uma noite escura, sem luar, olhos abertos na escuridão, deixa que todo o teu ser se derreta nessa obscuridade e alcança a forma de Bhairava.
88.
Olhos fecham, dissolve na escuridão, então abre teus olhos e te identifica com a sagrada forma de Bhairava.
89.
Quando um obstáculo se colocar no caminho da gratificação através dos sentidos, te apropria deste instante de vazio que é a real essência da meditação.
90.
Com todo o teu ser pronuncia uma palavra terminada com "AH" e no "H" deixa-te ser varrido pela torrente da sabedoria.
91.
Quando focas tua mente livre de estrutura no som final de uma letra, a
imensidão é revelada.
92.
Andando, dormindo, sonhando, a consciência livre de qualquer
propósito, conhece a tí mesmo como presença espacial radiante.
93.
Belisca uma parte do teu corpo e através deste único ponto, alcança o
domínio radiante de Bhairava.
94.
Quando através da contemplação, ego, atividade intelectual e mente se
revelam vazias, qualquer forma torna-se espaço ilimitado e a verdadeira
raíz da dissolução da dualidade.
95.
Ilusão perturba, os cinco sentidos obstruem a visão, separações
impostas por pensamentos dualísticos são artificiais.
96.
Quando tiver consciência de um desejo, considera-o pelo tempo de um
estalar de dedos, então derrepente, deixa-o partir. Então ele volta para o
lugar de onde veio.
97.
Antes de desejar, antes de saber: "Quem sou Eu, onde estou?" tal é a
natureza do Eu, tal é a profundidade espacial da realidade.
98.
Quando desejo ou conhecimento se manifestam, esquece seus objetos e
foca tua mente em desejos ou conhecimentos não materiais sendo o Eu. Então
alcançarás a realidade profunda.
99.
Qualquer conhecimento particular é decpcionante. Quando a sede do
conhecimento aflora, imediatamente realiza a espacialidade do próprio
conhecimento e seja Shiva/Shakti.
100.
Consciência está em toda parte, não há diferenciação. Realiza isto em
profundidade e assim triunfa sobre o tempo.
101.
Em estado de extremo desejo, raiva, cobiça, confusão, orgulho ou
inveja, entra no teu próprio coração e descobre a paz escondida.
102.
Se perceberes o universo inteiro como fantasmagoria, um inefável
prazer aflorará dentro de tí.
103.
Ó Bhairaví, não reside no prazer nem na dor, em vez disso esteja
constantemente na inefável realidade espacial que une a ambos
104.
Quando realizas que estás em todas as coisas, a ligação com o corpo
se dissolve, o prazer último emerge.
105.
Desejo está em tí, como em todas as coisas. Realiza que ele está
também nos objetos e em tudo que tua mente possa imaginar. Então,
descobrindo a universalidade do desejo, penetra no seu espaço radiante.
106.
Todo o ser vivo percebe o subjetivo e o objetivo, mas o tântrico
reside na união entre ambos.
107.
Sente a consciência de cada ser como a tua própria.
108.
Liberta a mente de todo o propósito e aprende a não dualidade. Então
dona dos olhos de gazela, o ser limitado se transforma no Ser absoluto.
109.
Shiva é onipresente, onipotente e onisciênte. Se tens os atributos de
Shiva és semelhante a ele. Reconhece o divino em tí mesmo.
110.
Ondas nascem no oceano e nele se perdem, chamas nascem e morrem, o
sol se mostra então desaparece. Assim devem todas as coisas encontrarem
sua fonte na esoacialidade e a ela retornar.
111.
Vaga ou dança até a exaustão espontânea. Então, repentinamente te
deita no solo e seja total nessa queda. Alí a essência absoluta será
revelada.
112.
Suponha que estás gradualmente sendo despojado de energia e
conhecimento. No momento dessa dissolução, teu verdadeiro ser será
revelado.
113.
Ó Deusa, ouve o ensinamento místico último: você precisa apenas fitar
o espaço sem piscar para alcançar a espacialidade de tua própria mente.
114.
Interrompe a percepção do som tapando teus ouvidos. Contraindo o
ânus, começa a ressoanar e toca aquilo que não está sujeito ao tempo ou
espaço.
115.
À beira de um poço, olha sem se mover para suas profundezas até que a
maravilha se apodere de tí e funde-te no espaço.
116.
Quando tua mente divaga externa ou internamente, é precisamente
quando o estado shivaísta se manifesta. Onde pode o pensamento se refugiar
para não saborear este estado?
117.
O Espírito está em tí e ao redor de tí. Quando tudo é pura
consciência espacial, alcança a essência da plenitude.
118.
Em estupor, ansiedade, sentimentos extremos, à beira do abismo,indo
para o campo de batalha, na fome ou no terror, ou ainda quando tú perderes
o controle, a essência da espacialidade da tua própria mente pode ser
possuída.
119.
Quando a vista de um certo lugar traz memórias passadas, deixa que
tua mente reviva estes instantes, então, quando as memórias se apagarem, a
um passo além, conhece a onipresença.
120.
Olha para um objeto, então, lentamente retira teu olhar. Então retira
teus pensamentos e transforma-te no recpetáculo da inefável plenitude.
121.
A intuição que aflora da intensidade da devoção passional flui no
espaço, libera-te e te permite alcançar o domínio de Shiva/Shakti.
122.
Com a atenção focada em um único objeto, podes penetrar qualquer
objeto. Relaxa então na plenitude do teu próprio Ser.
123.
A pureza exaltada por pessoas religiosas ignorantes parece impura
para o tântrico. Livra-te do pensamento dualístico e não considera nada
como puro ou impuro.
124.
Compreende que a espacial realidade de Bhairava está presente em
todas as coisas, em todos os seres e seja esta realidade.
125.
Felicidade reside na igualdade entre sentimentos extremos. Reside no
teu próprio coração e alcança a plenitude.
126.
Liberta-te do ódio assim como do apego. Então, desconhecendo qualquer
aversão ou amarra, desliza em direção ao divino dentro de teu coração.
127.
Ser de coração doce e aberto, medita naquilo que não pode ser
conhecido, o que não pode ser alcançado. Toda dualidade estando fora do
alcance, onde pode a consciência estabelecer-se para escapar do êxtase?
128.
Contempla o espaço vazio, alcança a não percepção, não distinção, o
insólito, além do ser ou não ser: alcança o não espaço.
129.
Quando o pensamento se dirigir a algum objeto, utiliza esta energia.
Vai além do objeto, e alí, fixa teu pensamento neste espaço vazio e
luminoso.
130.
Bhairava é uno com tua consciência radiante, cantando o nome de
Bhairava, tornar-te-á Shiva.
131.
Quando tú estabeleces: "Eu existo", "Eu penso isso ou aquilo", "tal
coisa me pertence", toca aquilo que é infundado e além de tais
estabelecimentos, conhece o ilimitado e encontra a paz.
132.
"Eterna, onipotente, insustentável, Deusa de todo o mundo
manifestado..."Seja esta e atinge Shiva/Shakti.
133.
O que chamas de universo é uma ilusão, uma aparição mágica. Para ser
feliz considera isto como tal.
134.
Sem o pensamento dualísta, o que poderia limitar a consciência?
135.
Na realidae, apego e liberação existem somente para aqueles que estão
aterrorizados pelo mundo e ignoram sua natureza fundamental: o universo se
reflete na mente assim como o sol sobre as águas.
136.
No momento em que tua atenção desperta através dos órgãos dos
sentidos, entra na espacialidade do teu próprio coração.
137.
Quando conhecedor e conhecimento são um só, o Eu divino brilha
esplendorosamente.
138.
Ó bem amada, quando mente, intelecto, energia e o eu limitado
desaparecem, então aparece a maravilha de Bhairava.
139.
Ó Deusa, Já te revelei cento e doze dhâranâ. Aquele que os conhece
escapa do pensamento dualista e atinge o conhecimento perfeito.
140.
Aquele que realiza um único destes dhâranâ se torna Bhairava. Sua
palavra se torna lei e ele obtém o poder de transmitir a Shakti à vontade.
141-144.
Ó Deusa, o ser que se torna mestre em uma única destas práticas
se vê livre da idade e da morte, ele obtém poderes paranormais, toda
yogini e todo yogin o terão em alta estima e ele presidirá seus encontros
secretos. Liberado em meio à atividade e realidade, ele é livre.
A Deusa disse:
Ó Senhor, deixa que sigamos essa maravilhosa realidade que é a natureza
suprema de Shakti! Quem então é idolatrado? Quem é o idólatra? Quem entra
em contemplação? Quem é contemplado? Quem faz oferendas e quem as recebe?
O que é sacrificado e para quem?
Ó Deusa de olhos de gazela, todas estas práticas são aquelas do caminho
externo. Elas servem para aspirações grosseiras.
145.
Somente a contemplação da mais alta realidade é a prática de um
tântrico. Aquilo que ressoa espontaneamente em alguém é a fórmula mística.
146.
Uma mente estável e sem características, aí está a real contemplação.
Visualizações de divindades cheias de cores não são mais que artifícios.
147.
A fé não consiste em oferendas, mas na realização de que o coração é
consciência suprema, livre de pensamentos dualístas. Em perfeito ardor,
Shiva/Shakti dissolve-se no Eu.
148.
Aquele que penetra um único yoga aqui descrito, conhece a plenitude
que se espalha dia após dia para alcançar a mais alta perfeição.
149.
Quando alguém entrega ao fogo da suprema realidade os cinco
elementos, os sentidos e seus objetos, a mente dualista e até mesmo o
vácuo, então temos a real oferenda aos Deuses.
150-151.
Ó Deusa suprema, aqui o sacrifício nada mais é que satisfação
espiritual caracterizada pelo prazer. A real peregrinação, Ó Pârvati, é a
absorção em Shakti que destrói toda a imperfeição e protege todos os
seres. Como poderia existir algum outro tipo de fé e quem seria
glorificado?
152.
A essência do Eu é universal. Ela é autonomia, bem aventurança e
consciência. Absorção nessa essência é o banho ritual.
153.
Oferendas, devoção, suprema Shakti são o mesmo. Isso é devoção
suprema.
154.
Respiração entra e sai, sinuosamente por sí própria. Perfeitamente
sintonizada com a respiração, Kundalini, a Grande Deusa, ascende.
Transcendente e imanente, ela é o mais alto local de peregrinação.
155.
Assim, profundamente estabelecido no ritual do grande prazer,
plenamente presente na ascensão da divina energia, grato à Deusa, o yogin
alcançará o supremo Bhairava.
155a-156.
O ar é exalado com o soum SA e inalado com o som HAM. Então o
recitar do mantra HAMSA é contínuo. Respiração é mantra, repetido mil e
uma vezes, dia e noite. É o mantra da grande Deusa.
157-160.
Ó Deusa! Eu acabo de te dar ensinamentos místicos últimos. Deixa
que eles sejam passados somente à seres generosos, àqueles que reverenciam
a linhagem dos Mestres, às mentes intuitivas libertas de ondulações
cognitivas e dúvidas e a quem for praticá-los. Pois, sem a prática a
transmissão se diluirá e aqueles que tiverem a divina oportunidade de
receber esses ensinamentos retornam ao sofrimento e à ilusão ainda que
tenham tido um tesouro eterno em suas mãos.
Ó Deus, eu agora alcancei a essência dos ensinamentos da quintessência do
tantra. Esta vida terá que ser deixada para trás, mas por que renunciar o
coração de Shakti? Assim como o espaço é reconhecido quando iluminado
pelos raios do sol, assim é Shiva dito através da energia de Shakti que é
a essência do Eu.
Então, Shiva e Shakti, brilhando em bem aventurança, novamente se fundiram
no indiferenciado.
Obs: Traduzido do Sânscrito para o inglês por Daniel Odier e do inglês para o português por Sérgio Baroukh. |
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